Ao longo do nosso
percurso de autorrealização, uma das nossas necessidades enquanto seres humanos
é a capacidade de entrarmos em contacto com uma dimensão que ultrapassa a nossa
personalidade egoica. Há necessidades que pertencem à esfera da sobrevivência,
mas há outras que enriquecem de sentido a nossa existência.
O desejo de conhecer e
compreender, a apreciação estética, o cumprimento de uma vocação no seio da
família, na vida profissional, ou em atividades de carácter social, são
elementos importantes na constituição do nosso sistema de valores, os quais vão
satisfazer algo mais vasto do que o nosso Eu.
Há experiências que
nos fazem sentir como parte de um todo, uma espécie de fusão com o universo,
cuja explicação não consegue ser decifrada pelas nossas estruturas mentais. O
nosso Eu, cheio de preocupações, dúvidas, inseguranças e apegos, desaparece por
instantes e somos invadidos por uma sensação de paz e integração, onde sentimos
que tudo é perfeito.
Tudo o que reduz a
presença do Eu permite-nos entrar numa dimensão que o transcende. Podemos
sentir esta dimensão através do contacto com a natureza, ao ouvirmos uma
música, na presença de outra pessoa, mediante uma epifania, ou uma descoberta.
Neste tipo de experiências sentimo-nos no auge das nossas capacidades: mais
inteligentes, mais percetivos, mais fortes, mais sensíveis, mais criativos.
Sentimo-nos libertos de bloqueios, de inibições, de defesas, de medos. Vivemos
em pleno o aqui e agora, e os sentimentos de autoaceitação e de autoestima
reforçam-se espontaneamente.
Cada pessoa vive de
maneira idiossincrática este tipo de experiências, na medida em que cada um
tende a aprofundar, pela sua própria subjetividade, novas formas de explorar o
mundo. Parece um paradoxo, mas a mais conseguida realização da identidade
individual traduz-se na transcendência do próprio Eu, pois estas vivências
provocam a sensação de que algo mudou dentro de nós para melhor.
Rossana Appolloni