quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

DEFORMAÇÃO DAS ROCHAS NA CROSTA TERRESTRE


Dobras no Carbónico alentejano (Foto de Luís Quintas)
Quem tenha o hábito de olhar para as rochas, no campo, reparou certamente que, muitas vezes, os estratos das sequências sedimentares ou metamórficas se apresentam dobrados e enrugados, exibindo aspectos por vezes muito diferentes do que foi o seu modo de jazida original, isto é, sobrepostos horizontalmente. Para quem não está preparado, estas ocorrências não deixam de ser intrigantes, sobretudo, habituados que estamos a considerar as rochas como materiais rígidos, quebradiços, e que, como tal, teríamos tendência a considerar indeformáveis, em termos de plasticidade e maleabilidade.
Observou, ainda, que certas rochas, como são, entre outras, os xistos argilosos e as ardósias, se apresentam finamente laminadas, assumindo fissilidade ou xistosidade, um tipo particular de deformação independente da inclinação das camadas, mas que reflecte a direcção do esforço compressivo a que estiveram sujeitas, direcção essa que é perpendicular ao plano da referida fissilidade. Nos flancos das dobras, a xistosidade tende a ser paralela à estratificação, ao passo que na charneira das mesmas tende a ser perpendicular.


                      Xisto argiloso. (Imagem retirada de www.cienciahoje.pt



Por força da gravidade terrestre, a estratificação das rochas sedimentares é, em princípio, inicialmente plana e horizontal. Relativamente a estas rochas, as estruturas observáveis no terreno, ou seja, a forma, a disposição e as relações entre os estratos resultam dos próprios processos que lhes deram origem e, ou são contemporâneas da deposição (ou sedimentação) de cada unidade, ou são consequência de transformações e deformações posteriores.


  Estratificação não deformada no Grand Canyon do Colorado, no Arizona, EUA


Além desta condição, as rochas sedimentares possuem, geralmente, fósseis e outros elementos, cuja forma original é conhecida, permitindo medir o valor de eventuais deformações sofridas.



          Trilobite (Neseuretus) do Ordovícico de Valongo, deformada. (Imagem obtida em www.fossilmall.com)
 
A deformação das rochas durante a formação de uma cadeia de montanhas, ou orogénese, resulta, sobretudo, das pressões (a litostática e as orientadas) que as afectam no interior da crosta, controladas pelas temperaturas aí reinantes, e depende da natureza dessas rochas.
O aumento da pressão litostática e da temperatura com a profundidade, além de promoverem o metamorfismo, transformam os materiais rígidos em outros cada vez mais plásticos (dúcteis), a ponto de se comportarem como um líquido muito viscoso, situação que antecede a sua transformação num magma. Nestas condições, as pressões orientadas responsáveis pela orogénese podem dobrar, enrugar ou fazer fluir materiais que, à superfície, se comportam como rígidos. O tempo é ainda um factor determinante nestes processos extremamente lentos, que necessitam de dezenas e até de centenas de milhões de anos para se consumarem.

Nas rochas que, pela sua natureza e pelas pressões e temperaturas a que estiveram sujeitas, apresentam comportamento quebradiço, a deformação manifesta-se apenas pela existência de numerosos planos de ruptura, ou falhas. Pode, neste caso, falar-se de deformação descontínua, sendo o cisalhamento o principal mecanismo.



  As rochas fracturam-se mas não dobram. (Imagem retirada de cien ciasreticencias.webnode.pt)


A partir de uma certa profundidade, as rochas começam a adquirir plasticidade (ductilidade), ou seja, passam a ter capacidade de se deformar sem sofrer fracturação, levando ao aparecimento de dobras. Nestas condições, os estratos adquirem curvaturas mais ou menos acentuadas, sem que haja variação sensível da sua espessura ao longo dos diferentes sectores da dobra. São as dobras isopacas ou concêntricas.



    Dobras isopacas ou concêntricas Foto de José Carlos Kullberg)


Num estádio mais evoluído da deformação, em condições termodinâmicas correspondentes a maiores profundidades, onde a ductilidade é já suficientemente grande, as rochas, de um modo geral, sofrem um achatamento generalizado, segundo uma direcção perpendicular à do esforço máximo a que são sujeitas. Deste modo, as rochas argilosas adquirem xistosidade e as dobras ficam com espessuras diferentes, mais delgadas nos flancos do que nas charneiras. São as dobras anisopacas ou achatadas.




Dobra anisopaca ou achatada (Imagem retirada de www.cprm.cov.br)


Em condições extremas de pressão e temperatura, correspondentes a grandes profundidades, as rochas comportam-se como fluidos viscosos, originando um tipo de dobras bastante diferente das anteriores, designadas por dobras de fluência.



    Dobras de fluência em migmatito (Imagem obtida em science.nationalgeographic.com)

A deformação não é a mesma em todos os pontos de uma cadeia montanhosa, o que se comprova pelo facto de exibirem zonas intensamente deformadas passando, gradualmente, a outras, onde esse efeito não se faz sentir. As correspondentes estruturas são tão variadas quanto as pressões e temperaturas que as criaram e quantos os tipos de rocha ali representados. Assim, nas cadeias orogénicas é possível distinguir vários domínios ou níveis estruturais, escalonados consoante as profundidades a que se deram as respectivas deformações.

No nível estrutural superior a deformação faz-se, essencialmente, por fracturação, que tem lugar nas zonas mais superficiais da crosta sob pressões litostáticas muito fracas ou, mesmo, nulas. Apenas as rochas muito plásticas (argilitos e evaporitos) chegam a dobrar. É o domínio das falhas ou das fracturas. No nível estrutural médio predomina a flexão; os materiais apresentam comportamento dúctil. É o domínio ou zona das dobras isopacas ou concêntricas, frequentemente acompanhadas de fracturação e de fendas de expansão no bordo convexo das dobras. No nível estrutural inferior, muito vasto e podendo atingir espessuras de 20 a 30 km, predomina o achatamento, evidenciado pela xistosidade, nas zonas mais elevadas. Abaixo destas faz-se sentir a fluência e, finalmente, a anatexia, isto é, a fusão dos materiais e consequente magmatismo que conduz à formação dos migmatitos e dos granitos.


Granito (Imagem obtida em www.granitosmarujo.com)



Galopim de Carvalho