A justiça é um dos grandes
marcos que contribui para a felicidade da humanidade. Se se conseguisse colocar
este valor, a par do da paz, como prioritários nos funcionamentos da família e
da escola, certamente que teríamos uma sociedade com menos injustiças sociais e
mais feliz. A justiça consiste no empenhamento em dar ao próximo aquilo que lhe
é devido, isto é, respeitá-lo nos seus direitos e estabelecer com ele relações harmoniosas
que promovam a equidade e que contribuam para o bem comum.
Pergunto-me, então: o
que é que de injusto pode passar-se, no seio da família, para que os direitos
de cada um não sejam respeitados? E que consequências podem daí resultar, quer
para cada um dos elementos dessa comunidade básica, quer para a sociedade em
geral? Não vou enunciar os múltiplos comportamentos dos membros da família,
assumam eles o papel de marido, esposa, pai, mãe, filhos, só para citar a
célula familiar restrita, nas suas múltiplas interacções, susceptíveis de gerar
injustiças. Desejava, apenas, referir, como casos limite, as consequências que
advêm para as crianças que foram abandonadas ou maltratadas, fruto das
injustiças e das violências que sobre elas recaíram. E de quantas limitações
elas sofrem, seja nas emoções, na inteligência, na vontade e no comportamento!
É a agressividade dirigida, quer para os seus pares, quer para os adultos que
delas cuidam; é a instabilidade emocional, passando da boa disposição para o
mutismo; são as fúrias que, em casos extremos, atingem a tentativa de suicídio.
E as dificuldades de aprendizagem que elas manifestam, seja na memorização,
seja no cálculo mental, seja na compreensão! Mas, o que mais me impressiona
nelas é a sua dificuldade em suportar a frustração. Elas, à mínima
contrariedade, desistem, voltam costas, desinteressam-se, indignam-se.
Ora todos estes
comportamentos (ou quase todos) e atitudes indesejáveis decorrem daquilo que
elas viram e viveram na família. Claro que a escola irá ressentir-se deles.
Poderá ela modificar-lhes um pouco este tipo de atitudes? Sim, se ela tiver
regras claras e as fizer cumprir; apostar, com todos os elementos que a
integram, em relações serenas mas firmes com os alunos, ainda que da parte destes
haja agressividade; não deixar que um insucesso escolar se transforme numa
barreira intransponível, socorrendo-se, para isso, de directores de turma
estimulantes, de psicólogo e assistente social que estabeleçam acções
coordenadas quer com o aluno, quer com a família; que utilize metodologias
participativas em que o aluno não seja mais do que um mero expectador.
Enfim, muito há a
fazer para que na nossa sociedade haja justiça. Mas é na família e na escola
que ela começa a ter forma e a poder tornar-se em realidade.
Mário Freire