Restos
de seres vivos do passado ou vestígios da sua actividade conservados no seio de
algumas rochas, os fósseis são o objecto de estudo de uma disciplina científica
a que foi dado o nome de paleontologia [do grego palaios (antigo), ontos (ser)
e logos (estudo)]. São, ainda, tema fulcral em: paleobiologia, interessada na
actividade dos antigos seres enquanto vivos; paleoecologia, focada na
reconstituição de ecossistemas antigos; paleobiogeografia, que estuda a
distribuição espacial de animais e plantas do passado.
No
sentido mais antigo do termo, fóssil (do latim fossile) era todo o material que
se desenterrava ou extraía de dentro da terra, abrangendo, portanto, os
minerais, as rochas, os achados pré-históricos e arqueológicos e os fósseis, no
sentido que hoje damos à palavra. As expressões carvão-fóssil e
combustível-fóssil, ainda em uso, são reminiscências deste conceito antigo. Só
no século XVIII o termo passou a ser usado no sentido que hoje tem em
paleontologia, ou seja, no de um resto de ser vivo do passado ou num vestígio
da sua actividade conservados no seio de uma rocha. Entendidos como as “letras”
que nos permitem “ler” nas rochas, os fósseis têm-nos permitido conhecer uma
parte importante da história da Terra e da vida. Designados no passado por
petrificados (termo usado como substantivo), dão suporte ao estabelecimento das
sequências sedimentares estratificadas no âmbito da biostratigrafia e
constituem um pilar fundamental no estudo da evolução das espécies, iniciado
por Charles Darwin no século XIX.
O
homem pré-histórico já conhecia os fósseis, embora não tenhamos elementos que
nos permitam saber, com rigor, que significado lhes atribuía. Provavelmente
terão alimentado superstições ou sido usados como objectos de adorno. São conhecidas
sepulturas do Paleolítico, do Neolítico e da Idade do Bronze, onde os corpos se
encontram rodeados por vários fósseis. Em Portugal, numa necrópole neolítica de
Aljezur, foram encontrados dentes fósseis de seláceo do Miocénico.
Da Antiguidade ao século XVI
Na antiguidade
pré-socrática, alguns filósofos da Escola Pitagórica interpretaram
correctamente o significado dos fósseis encontrados no terreno, explicando o
processo da sua formação segundo um modelo muito próximo do actualmente aceite.
O filósofo grego Xenófanes de Colophon (circa 570-460 a. C.), na região da
Lídia, na Ásia Menor (actual Turquia), reconheceu a verdadeira natureza de
impressões vegetais fósseis e, um século mais tarde, o geógrafo e historiador,
Heródoto (circa 485-420 a. C.), aceitava, como restos de animais marinhos, os
fósseis encontrados no vale do Nilo.
Num
retrocesso evidente, alguns seguidores de Aristóteles (384-322 a.C.) defendiam
a intervenção de uma “virtude” que, através de uma semente, gerava e
desenvolvia os fósseis na terra. Propuseram, ainda, a existência de um “suco
lapidificante” (petrificante) ou de um “sopro oriundo do betume terrestre que,
por acção dos raios solares, emergia da Terra e petrificava os organismos
vivos”. Plínio, o Velho (23-79 d.C.) e outros autores latinos, sugeriam que
estes achados caíam do céu ou da Lua.
Na
Antiguidade oriental, o dragão, figuração sempre associada à civilização
chinesa, estava intimamente ligado aos achados de ossos fósseis, que hoje
sabemos serem de dinossáurios (ainda desconhecidos nesse tempo). Então aceites
como vestígios petrificados de dragões, o seu uso em terapia era conhecido e
está descrito em textos de medicina chinesa dos séculos XVI a XI antes de
Cristo. Esta crença manteve-se e, no século III da nossa era, ainda se
acreditava que tais restos correspondiam a restos ósseos das ditas figurações
míticas. No livro Hua Yang Guo Zhi, atribuído a Chang Qu, tido como o primeiro
registo escrito da ocorrência de fósseis de dinossáurios, editado durante a
dinastia Jin Ocidental (265-317 d.C.), fala-se de “ossos de dragões”
provenientes de Wucheng, na província de Sichuan, região hoje bem conhecida dos
paleontólogos pela abundância de esqueletos destes vertebrados da era
mesozóica.
Galopim de Carvalho