quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O MÉTODO DE ENSINO MÚTUO V



Além da gratidão do aluno a quem o leccionou carinhosamente, há a salientar a eficiência do professor e dos métodos utilizados, supostamente em resultado da preparação na Escola Normal de Belém, em funcionamento desde 1816.
É certo que o autor (José Silvestre Ribeiro) não fornece dados cronológicos sobre a sua frequência escolar, mas nascido em 1807, o episódio poderá ter tido lugar quando ele tinha cerca de 10/12 anos, isto é, por volta de 1817-1819, datas que encaixam perfeitamente.
A notícia publicada no Tomo III, a que me venho reportando, com o título de “Escolas de ler, escrever e contar nos corpos de linha”, pp.224-235, contém muitas informações sobre o tema, que enunciarei em seguida e remata com a informação de um litígio com a Sociedade de Educação de Paris que teve o seu feliz epílogo no reconhecimento desta Sociedade acerca da utilização do método mútuo em Portugal, como se pode verificar pela trannscrição seguinte:
....”Desde  o mês de Outubro de 1815, uma determinação da Regência creou em Portugal escolas de ensino mútuo. Em 1817, achavam-se em plena actividade; hoje estão florescentes. A ignorancia em que se estava da existencia das escolas portuguezas, na época da ultima assembleia geral, nos obrigou a deixal-as em silêncio; hoje corrigimos esta omissão, com o mais vivo prazer. Em Outubro de 1818, eram frequentadas 55 escolas portuguesas por 3:843 discipulos, tanto paizanos como militares; a prosperidade destas escolas é de feliz presagio para a propagação do método em todo o continente portuguez”.

Passemos então a enumerar as Instruções para os Professores das Escolas de Primeiras Letras dos Corpos de Linha do Exército, compiladas em Regulamento distribuido aos professores, documento que tem a data de 29 de Outubro de 1816, assinado pelo Secretário de Estado, Gregorio Gomes da Silva.

É um documento de 10 páginas de formato A-4, muito minucioso em toda a regulamentação, como se pode verificar pela leitura da “ TABOA DAS MATERIAS, QUE FAZEM O OBJECTO DESTAS INSTRUÇÕES”:


“ Formação da Escola......§ 1º    até....…….. ....................  §  5º
Tempo d’Aula....................................  .....................    §  6º
Horas da Entrada, e sahida d’ Aulas. ....§ 7º       até... ... §  8º
Distribuição do tempo d’Aula............ .  § 9º        até.......§ 10º
Compêndios das lições d’Aula..............§ 11º .....até... ....§ 14º
Relação dos Professores com  os Comandantes dos Corpos.§ 15º até §  16º
Escalas do Progresso dos Discipulos.........§ 17º.    até....§  19º
Economia da Escola.............  §20º  ............ até.......§  23º
ExercíciosReligiosos.............§24º...............até       §  29º
Autoridade dos Mestres sobre os Discipulos .§ 30º.......   até.. §  31º
Premios dos Discipulos.......§ 32º   ..................até......§  35º
Castigos dos Discipulos........  § 36º  ................ até... ..§  39º
Deveres dos Mestres para  seus discipulos.. § 40º  ..... até...§  41º
Deveres dos Diccipulos para seus Mestres.. § 42º  .....até   §  44º

Como se pode verificar pela simples leitura do sumário das matérias versadas no Regulamento, o programa era rigoroso, devendo destacar-se o cuidado posto no diagnóstico de cada aluno relativamente à sua situação no capítulo de instrução em Leitura, Escritura, Aritmética, Etimologia, Sintaxe, Ortografia e Pontuação da Língua Portuguesa - § 1º.
A partir dos resultados obtidos, os alunos eram escalonados pelos diferentes graus, constituídos por seis classes: Alfabeto, Silabário, Vocabulário, Leitura de frases e períodos, Etimologia e Sintaxe e finalmente Ortografia e Pontuação - § 3º.
Era também atribuída grande importância à disciplina de escritura, a par da evolução no conhecimento da Língua Portuguesa, prevendo inclusivamente a progressão no material de escrita a utilizar. areia, pedra ardósia e finalmente papel. - § 4º.
O testemunho legado por José Silvestre Ribeiro é, além de uma fonte histórica de grande interesse no estudo da formação inicial de docentes,  a prova da dificuldade de se iniciar o discente  na sua construção cultural, pela aquisição dos instrumentos e ferramentas indispensáveis ao mundo cognitivo.
José Silvestre Ribeiro é um guia precioso para a nossa informação através da obra monumental que nos legou:
- RIBEIRO, José Silvestre - HISTORIA DOS ESTABELECIMENTOS SCIENTIFICOS LITTERARIS E ARTISTICOS de PORTUGAL nos sucessivos Reinados da Monarquia - obra monumentoal de 18 volumes - TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS, LISBOA -  1871-1891.
transcrição retirada do Tomo III, 1873, pp.225-226.

                                                        Francisco Goulão