segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

FORMAÇÃO CÍVICA NA ESCOLA: SIM OU NÃO?



            Está em curso, para consulta pública, até final do corrente mês de Janeiro, um documento emanado do Ministério da Educação sobre uma proposta de uma nova estrutura curricular em que se propõe, entre várias alterações, a supressão da disciplina de Formação Cívica nos ensinos básico e secundário.
O texto que se segue foi enviado para o M.E. e constituiu a minha participação na referida consulta.
“Diz-se no documento agora colocado que ‘os pressupostos que orientam as medidas propostas assentam na definição de objectivos claros, rigorosos, mensuráveis e avaliáveis, reorientando o ensino para os conteúdos disciplinares centrais’. Não se poderá estar mais de acordo. Talvez tenha sido por falta de uma tal definição que levou a que a disciplina de Formação Cívica fosse considerada dispensável.
Ora, a sua existência numa estrutura curricular poderia responder a um conjunto de necessidades situáveis nos domínios dos conhecimentos, atitudes e valores de que a escola e a sociedade de hoje tão carentes se encontram. Para isso, haveria que definir-lhe os tais objectivos ‘claros, rigorosos, mensuráveis e avaliáveis’, em torno de temas bem determinados.
Permito-me enunciar alguns desses temas:

* relações humanas e regras de conduta na escola e na sociedade;
* participação individual e colectiva a diferentes níveis (na turma, na
   escola, na sociedade);
* gestão de conflitos interpessoais;
* sentido da responsabilidade e da coerência;
* participação democrática ao nível do debate das ideias;
* educação para a solidariedade e cooperação;
* da solidariedade ao voluntariado; motivações e formas de
   voluntariado;
* educação para o consumo;
* educação para os direitos humanos;
* educação para a sustentabilidade;
* educação para a segurança;
* educação para os media;
* conhecimento do mundo do trabalho e das profissões;
* educação política (símbolos nacionais, órgãos de soberania
   nacional, direitos e deveres dos cidadãos);
* Portugal, a União Europeia e os Países de Língua Oficial
   Portuguesa.

Estes seriam alguns dos temas que me pareceriam suficientemente pertinentes para proporcionarem uma mentalidade mais participativa e responsabilizadora do aluno na escola e na sociedade e contribuírem para fazer dele um cidadão mais consciente dos seus direitos mas, também, dos seus deveres.
A importância de uma disciplina deste tipo é de tal modo reconhecida para a formação global dos alunos que países como a Inglaterra, Finlândia e Espanha a possuem e com carácter obrigatório.
A metodologia a utilizar, a partir da definição de conceitos, estudo de casos, simulações e projectos a concretizar na escola e na comunidade, deveria fazer apelo ao trabalho individual, ao trabalho em pequeno grupo e à turma como um todo.
Os docentes responsáveis pela disciplina deveriam ter um tempo de serviço susceptível de assegurar uma maturidade profissional e global, para além de outras condições, eventualmente julgadas como pertinentes; ser-lhes-ia dada formação adequada e o seu recrutamento incidiria, prioritariamente, entre psicólogos e professores de filosofia, não se excluindo professores com outras formações.
A avaliação, de carácter individual, teria em conta os conhecimentos revelados pelo aluno, o seu espírito de cooperação, de iniciativa e capacidades para resolver problemas e levar a cabo projectos junto da comunidade, dentro e fora da escola.
Consoante o desenvolvimento que se lhe quisesse dar, a sua leccionação seria efectuada em um ou dois anos de escolaridade, a definir.
A inclusão desta disciplina com idêntico estatuto a qualquer outra, na estrutura curricular, com uma avaliação tão exigente como a das restantes, certamente que iria contribuir para um país onde o civismo fosse uma palavra com mais valor.” 

                                Mário Freire