segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O SABER E O SEU SENTIDO


Há já algum tempo que David Sloan Wilson, investigador em Biologia Evolutiva, deu na revista Visão uma entrevista em que fala do tema da sua especialidade mas tenta extrapolar os seus conhecimentos para outros domínios. Diz ele que o nível cultural é uma forma de evolução e que não existe nenhum assunto humano que não possa ser abordado com êxito a partir de uma perspectiva evolucionista. Diz ainda que “a evolução já fez isso para a Biologia e agora estamos a fazê-lo para tudo o resto. O que inclui a religião”.  
            Para se alcançar o saber já há muito que a metodologia científica propõe que a recolha de dados, isto é, a selecção dos factos que sejam relevantes no estudo de um tema, constitua uma condição para existir informação. Mas esta não é condição suficiente para se afirmar que há já um saber.
            Normalmente, no mundo em que vivemos, ficamo-nos por esta etapa: recepcionamos dados, nem sempre fiáveis, a partir de uma ou várias fontes e, depois, construímos os nossos conceitos. Ora, nem sempre estar-se informado sobre algo significa conhecer-se o que se deseja. Relatar um acontecimento é já ter atingido um certo patamar na informação. Mas ele só será verdadeiramente conhecido quando for possível realizar uma análise, decompondo-o nos seus elementos, confrontá-lo com outros, aparentemente semelhantes, estabelecer analogias e diferenças, inferir consequências.
            Ora Sloan, como cientista, tenta inferir consequências, fazendo, depois, uma generalização das suas concepções. E, pelo que entendi na entrevista, ele, como darwinista, está a tentar essa generalização, incluindo a religião como uma forma de expressão cultural.
            Com um fio condutor diferente, Teilhard de Chardin, no século passado, fez uma outra abordagem à evolução. Este, padre jesuíta e paleontólogo, estabeleceu que todo o Universo evoluiria do caos primordial para o aparecimento da consciência humana. Esta, por sua vez, passaria a formas mais complexas, dando origem a uma super-humanidade. Produzir-se-ia, então, uma unidade biológica e crística, formada por pessoas movidas pelo
altruísmo mais generoso e pela graça sobrenatural própria do cristianismo. Nesta abordagem, haveria uma força criadora que tudo regulava: Deus.
            Ambos os autores, a partir dos dados que estudaram, construíram concepções diversas sobre o que gera e o que significa a evolução.
            Diz-se no Livro da Sabedoria, versículo 8, que “se alguém deseja uma vasta ciência, ela (a sabedoria) é que sabe o passado e entrevê o futuro (…), conhece os sinais e os prodígios e o que tem de acontecer no decurso das idades e dos tempos.”
            Ora, cada um destes investigadores, a partir dos seus saberes científicos, construiu uma visão do mundo e do homem muito diversa, tentando conhecer, com base nos sinais e prodígios, o que tem de acontecer no decurso das idades e dos tempos.           
Cá por mim, a minha modesta sabedoria vai no sentido de afirmar que a ciência e a religião não jogam uma contra a outra; elas situam-se em planos diferentes. Isto não significa que não deixe de admirar a vastidão, a complexidade e a harmonia existentes na Natureza e no Universo e entenda que não é o acaso, um dos marcos do darwinismo, que as justificam. Por outro lado, admito que outros procurem ver na religião algo que, muito prosaicamente, possa ser explicado pelo tipo de evolução de que Sloan é defensor.
Afinal, não é na diversidade da paisagem, seja ela de natureza biológica ou ideológica, que reside a riqueza? E a esta riqueza não existe crise que se lhe possa opor!
                                                                         
                                                                                           Mário Freire